A instalação da energia solar no Brasil representa mais do que uma alternativa de energia limpa; significa a possibilidade de desenvolvimento para comunidades que, ainda hoje, estão isoladas. Na Amazônia existem cerca de 2 mil famílias sem acesso à energia elétrica. Ainda que lentamente, essa realidade está se transformando com a instalação de miniusinas solares na região.
O quarto episódio do programa Linhas, produzido em 2014 pela ONG Greenpeace, retratou a vida dos moradores de Sobrado, uma das 12 comunidades ribeirinhas do Amazonas que contam hoje com fotovoltagem. Wemelly Barroso Souza, 13 anos, conta que com a luz disponível todos os dias, a escola da região passou a dar aulas de noite, o que possibilitou que adultos frequentassem as aulas. “Meu pai, que mal sabia escrever o próprio nome, já está aprendendo a ler”, diz.
Nos centros urbanos, o acesso à internet está, cada vez mais, popularizado. A jovem Wemelly relata um pouco de sua experiência agora que também está conectada a rede. A menina teve a possibilidade de se engajar em temas como, por exemplo, a Consciência Negra, e tem transmitido esse conhecimento para o resto de sua comunidade.
Isabel Teixeira Queiroz, de 51 anos, é uma das fundadoras de Sobrado. Para ela, a melhor coisa de ter eletricidade é a água gelada. “Poder tomar um copo de água bem fresquinha no meio de um dia de trabalho na roça é muito bom”, conta.
Em 2011, cerca de 222 famílias de 12 comunidades localizadas nos munícipios de Autazes, Barcelos, Beruri, Eirunepé, Maús e Novo Airão (Amazonas) foram contempladas pelo Projeto Mini-Usinas Fotovoltaicas da Eletrobrás, com faturamento pré-pago administrado pela Amazonas Energia, por meio do Programa Luz Para Todos, do governo Federal. A população dessa região estava acostumada a contar com energia do ‘motor luz’, ou, muitas vezes, de lamparinas ou apenas luz de velas.
A primeira unidade de fotovoltagem foi inaugurada na comunidade do Sobrado, que localiza-se em uma das 400 ilhas do Parque Nacional das Anavilhanas. Sendo um dos maiores arquipélagos fluviais do mundo, para que a as redes de energia elétricas convencionais chegassem até a comunidade, seria necessário passar por rios caudalosos, matas fechadas e contar com eventos meteorológicos, com grande potencial de destruição, como chuvas e tempestades elétricas.
O que pode parecer banal aos que cresceram em centros urbanos com energia elétrica disponível 24h por dia, representa mudanças muito significativas na vida dessas comunidades. A possibilidade de armazenamento de alimentos em geladeiras ou freezers, a disponibilidade de água gelada, acionar um interruptor, assistir televisão e ligar um ventilador é uma rotina recente para essa população.
Situação atual
Diego da Silva Santos, engenheiro elétrico, especialista em energias renováveis e integrante da ONG Sociedade do Sol, explica que a população brasileira ainda está desinformada sobre o sistema de microgeração de energia. “É um marco para o sistema elétrico brasileiro permitir que as pessoas gerem a sua própria energia, isso tem muitas vantagens”, conta.
Ainda comenta que essa tecnologia se desenvolve no país desde 2012, a partir da resolução 482 da Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica), que instituiu a micro e a mini geração de energia. “Antigamente você podia ter o sistema fotovoltaico na sua casa. No entanto, era necessário fazer um sistema em que toda a energia produzida fosse consumida ou armazenada”, pontua. Isso tornava o custo muito alto por necessitar de um sistema de bateria, caro e com vida útil muito curta.
A nova regra estabeleceu um sistema de compensação, em que os brasileiros podem gerar energia em suas próprias casas e economizar na conta de luz. Pequenos geradores instalados em residências, por exemplo, produzem energia e o que não é consumido, é injetado no sistema da distribuidora. Assim, o consumidor que gera sua energia, recebe um crédito que pode ser abatido na conta de luz.
A resolução é valida para geradores que utilizam fontes alternativas de energias, como paneis solares, pequenas turbinas eólicas, geradores a biocombustíveis e minicentrais hidrelétricas, além de geração distribuída de pequeno porte.
No entanto, o ICMS (Imposto sobre a circulação de mercadorias e serviços) cobrado na conta de luz de um microgerador de energia é muito elevado, o que inviabiliza a popularização da energia solar no país. No final de abril deste ano, o Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz) determinou a isenção do ICMS para os brasileiros que produzem energia e enviam à rede elétrica de abastecimento.
Os descontos já foram conhecidos por São Paulo, Pernambuco e Goiás. Minas Gerais havia tomada a medida por conta própria, em 2013, e hoje é o estado brasileiro com maior número de redes conectadas a microgeradores de enegia solar.
A redução de impostos torna a tecnologia mais viável e a tendência é que se popularize. Nesse sentido, Diego considera que o governo tem dado grandes passos e a expectativa é que a Caixa Econômica, através do Construcard – programa de crédito do governo federal para construção e reforma de casas – financie sistemas de fotovoltagem para as pessoas.
A geração de energia solar, além das vantagens ambientais, pode auxiliar a geração de energia em comunidades carentes do país. Não apenas carentes, mas aquelas que estão distantes de meios urbanos. O governo federal já investe em programas de fotovoltagem em regiões como o Amazonas, no norte. Já na região sudeste, o desenvolvimento dessa tecnologia é menor devido a grande disponibilidade de redes.
Para o especialista, o futuro da produção energética brasileira passa pela fotovoltagem. A Alemanha é o país que mais produz energia solar e sua região mais ensolarada tem menos incidência de raios solares do que a região menos ensolarada do Brasil.
“O Brasil tem muita disponibilidade para produção de energia solar, com muitas regiões ensolaradas, em que poderia estar gerando energia no próprio local de consumo. Isso evitaria crise energética. Porque, hoje, o governo está utilizando energia de fontes térmicas extremamente poluentes”, afirma.
Raphael Pintao, sócio da empresa Neosolar Energia, especializada na instalação dessa tecnologia, pontua que a população sem energia é uma minoria no país e que a adoção de energia solar para esse segmento é “a melhor alternativa”, tanto ecologicamente, quanto financeiramente.
“A adesão tem aumentado rapidamente, há iniciativas do governo nesse sentido. Assim como há aumento da procura direta por quem não tem energia”, diz. O empresário explica que no Brasil ainda não há mercado em grande escala de geração de energia solar. No entanto, há uma adesão crescente em pequena escala, de residências e comércios.
Para ele, as perspectivas desse mercado no país são de crescimento, até pelo estágio atual que estamos, “bem atrasados” em relação ao mundo. “As quedas de preço já não serão tão significativa. Porém, hoje, já vale a pena investir. Com o aumento dos preços da energia, cada vez mais será uma alternativa ambientalmente e financeiramente muito interessante”, conclui.
Fonte: Ninja http://bit.ly/1Iiv8hf